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Crônica da semana por Nilton Morselli

Descoberta de Páscoa

Sei que não é o assunto mais premente do momento, mas é importante estabelecer o sentido das coisas. Por muito tempo, pensei que a música “Coelhinho da Páscoa” começava com uma frase afirmativa sobre o animalzinho (“Coelhinho da Páscoa que trazes pra mim”). A falta da vírgula é que deve ter criado a confusão na minha cabeça. Com a pontuação no lugar certo, indicando um vocativo, o trecho inicial é na verdade uma pergunta dirigida ao amigo peludinho (“Coelhinho da Páscoa, que trazes pra mim?”). Quando se canta não é fácil fazer a entonação da interrogação, que até pode ser confundida com exclamação.

Pergunta a que ele responde: – Um ovo, dois ovos, três ovos assim.

Isso ficaria claro com a flexão do verbo trazer (“trazes”, segunda pessoa do singular, tu) se a criança que vos fala soubesse a conjugação desse verbo transitivo irregular no presente do indicativo. Não era o meu caso, e acho que ainda não é.

Esclarecida a primeira questão, na segunda parte, outra dúvida. “Coelhinho da Páscoa, que cor você tem?” Aqui, imaginava que o moleque (a identidade do interlocutor fica subentendida na letra. Sintaticamente, o sujeito é oculto ou indeterminado) queria saber de que cor era o ilustre representante da família dos roedores. Na verdade, a indagação diz respeito ao produto que ele entrega, os ovos de chocolate. Não era, portanto, predicativo do sujeito.

A que ele responde: – Azul, amarelo, vermelho também.

Pela música, concluí que o bichinho dentuço não produz (bota) o ovo. Apenas trabalha para o delivery da floresta.

Talvez para evitar a dúvida quanto à parte final da canção, as gravações mais modernas substituem o “você” por “eles” (“Que cor eles têm?”), o que é bom para a compreensão.

Hã hã, bem que eu estranhava, pois nunca vi um coelho azul, amarelo ou vermelho. Ou melhor, já vi, mas apenas nas obras de Romero Britto.

Foi ótimo descobrir isso. Semana passada. A Páscoa está chegando e eu ia cantar errado de novo.

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