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Crônica da semana por Nilton Morselli

Onde nasce a chuva

Dizem que quando arma tempo pelos lados de Jurupema, a chuva vem. Não se trata de previsão, mas de constatação. E vem mesmo. Basta esperar que o pretume das nuvens vá baixando aos poucos e se aclarando no horizonte, também vagarosamente, para desaguar sobre Taquaritinga a chuva imprescindível. Ela nos alegra e, nesses tempos de estiagens longas, passamos a saudá-la como a uma visita que há muito não aparece.
“Choveu, mas continua calor”, reclamam alguns, esperançosos de que a pancada fizesse cair a temperatura, o que nem sempre acontece. Foi-se o tempo em que frentes frias faziam jus ao nome neste país tropical, que dirá o poder de uma “chuva de verão” para arrefecer nossas tardes de calor menopáusico. E por aqui, na região da Califórnia Brasileira, nem tudo são flores com a chegada da primavera. Recebemos um buquê de altas temperaturas, que vão aumentando com a proximidade do fim do ano, capazes até de derreterem a neve de algodão das árvores de Natal. Mas tudo isso já faz parte da normalidade, com a qual somos obrigados a conviver, pois não há outra saída.
Nunca conversei sobre o assunto com alguém de Jurupema, mas já cheguei a fantasiar que no distrito pudesse ser corriqueiro as pessoas saberem como e onde nasce a chuva. Bastaria perguntar. Um morador diria ao visitante: é aqui, bem em cima de onde estamos, que nuvens repletas de cristais de gelo encontram as condições ideais de temperatura, altitude e pressão, e o vento que sopra das serras verdejantes que emolduram nosso lugar se encarregam de distribui-las para além de onde a vista alcança. A contemplação do espetáculo figuraria em qualquer pacote turístico.
O forasteiro, deslumbrado com a novidade, ouviria também com especial atenção a história dos tremores de terra, essa nada saudosa ou romântica. Da mesma forma que começaram, os estalos seguidos de abalos cessaram da noite para o dia. Jurupema e seus enigmáticos fenômenos climáticos fazem parte do folclore que se perde no tempo, paralelamente à atmosfera encantada das festas de São João Batista, em que devotos descalços andavam sobre brasas. Mas, para nossa sorte, é só nas quadrilhas juninas que a chuva era mentira.
A verdadeira vem em gotas, de cuja abundância dependemos. Se a chuva realmente nasce naquelas bandas pouco importa. O senso comum é que vale. E rogamos que ela caia sempre generosa e fecunda, gratos à natureza persistente, que garante o ciclo das águas que banham o solo e o transformam em cama fértil.
Continuaremos de olhos fixos no balé das nuvens em formação. O véu branco que faz o céu tocar a terra aos poucos se dissipa, abastecendo nossos rios e reafirmando a sabedoria transmitida pelas gerações que nos antecederam. Com exatidão espantosa, os avós sabiam quando era tempo bom para plantar – ou se era ano de secura. A precisão cabocla faria corar de vergonha os caríssimos satélites meteorológicos que orbitam sobre nossas cabeças. E quando daqui virmos nuvens se levantando sobre a terra que serviu de berço e túmulo dos nossos antepassados, pode esperar: vem água. Não esqueçam o guarda-chuva, senhoras e senhores.

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