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Crônica da semana por Nilton Morselli

Um bar que marcou época

Por 33 anos, o Bar e Restaurante Girotto foi o ponto de encontro de Taquaritinga. Mais que um local para beber, comer bem e relaxar, aquela esquina das Ruas Prudente de Morais e General Osório era uma espécie de escritório informal dos agricultores: “Muita fazenda foi comprada e vendida lá”, lembra Gilson Girotto, o último da família a cuidar do estabelecimento, onde também se negociava gado puro de origem.
Os pequenos negócios também tinham vez na esquina famosa. Reza a lenda que volta e meia um pecuarista vendia uma cabeça de gado no período da manhã, bebia um pouco além da conta na hora do almoço e comprava a mesma rês à tarde por um preço maior. E ia embora convicto de que fizera um ótimo negócio. Talvez porque em certa época a inflação era, de fato, galopante.
O bar foi fundado pelos irmãos Ângelo, o “Nim”, Geraldo, o “Dinho”, e José Alcindo, no fim de 1967. Dois anos depois, outro irmão, Horácio, o “Bolão”, entrou na sociedade. Quem já tinha experiência no setor era “Nim”, pai de Gilson, que fora gerente do Posto Guanabara, em Jaboticabal.
Além da turma do chapéu, o bar também era frequentado por políticos de todas as cores partidárias. Muitos comemoravam lá as campanhas vitoriosas, enquanto na mesa ao lado outros afogavam as mágoas da derrota. Figuras de destaque como Mário Covas, Paulo Maluf e Orestes Quércia, todos governadores do Estado, estiveram por lá. Covas tinha uma queda por pastel – e o do Girotto era irresistível.
A qualidade da cozinha era reconhecida regionalmente e os petiscos estavam sempre frescos, tudo preparado pela família, que jamais escondeu sua predileção pelo Palmeiras. Muito pelo contrário, vários símbolos do verdão podiam ser vistos por lá. Nem por isso, torcedores de outros times deixavam de frequentar.
Como o estabelecimento foi precursor na instalação de TV por assinatura, era normal duas torcidas se encontrarem, sem brigas, em dias de clássico. Numa tarde domingo, tinha mais gente no bar para ver Corinthians e Palmeiras do que no Taquarão, onde o CAT estava jogando.
O Girotto ficou tão afamado que era lá que jornalistas da televisão iam fazer suas refeições quando vinham transmitir jogos do Leão, no começo dos anos 1980. Foi assim com José Luiz Datena, Silvio Luiz e o saudoso Luciano do Valle.
O futebol estava tão presente no dia a dia do estabelecimento que a taça ganhada pelo CAT em 1992, quando foi campeão da Divisão Intermediária, por muito tempo ficou exposta para a freguesia. O presidente do clube na época, o saudoso Armiziton Gibertoni, foi quem a levou – ele almoçava lá todos os dias.
O ribeirão-pretano Sócrates, bom de bola e de copo, que se notabilizou como jogador do Corinthians, foi tantas vezes ao Girotto nos anos 1980 que acabou ficando amigo da casa. O cantor Moacyr Franco chegava com o rosto meio encoberto por um chapéu para não ser reconhecido. Assim podia fazer sua refeição sem ser importunado por fãs.
Em virtude de sua localização privilegiada, no centro da cidade, no Carnaval também muita gente se concentrava no estabelecimento. Na década de 1990, por várias vezes aconteceu algo inusitado: reunir na mesma noite os ensaios dos blocos Batata Doce e Babadikiabo. Cada um usava uma rua.
No começo da Fatec, a galera das repúblicas se reunia lá. Eu estava no meio, porque integrei a segunda turma de processamento de dados. Mas tudo o que é bom um dia chega ao fim. No ano 2000, por razões diversas, o bar baixou as portas. Várias tentativas, de outros empreendedores, de reativar o ponto acabaram frustradas em poucos meses. Até que o prédio foi reformado e alugado para a Credicitrus, que em 2016 mudou-se definitivamente para lá. Veja como a história se repete: o banco de cooperativa vive de fazer negócios com o pessoal do agro. A diferença é que não tem uma cervejinha na mesa.

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