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Crônica da semana por Nilton Morselli

Caminho de volta

Os adolescentes do meu tempo não falavam tanto em morar no exterior como agora. A exceção ficava por conta dos descendentes de japoneses, porque na época ser um dekasségui compensava muito, do ponto de vista financeiro – tenho dois amigos que foram embora tão logo nos formamos no ensino médio e nunca mais voltaram. Um que foi para a Itália voltou. O restante ficou.
Antes havia a barreira da língua, mas acho que isso nem era o problema. Faltava mesmo um pouco de coragem, sentimento que sobrava nos antepassados. Nossos avós ou bisavós cruzaram oceanos a bordo de navios, em viagens intermináveis e às vezes sob condições inóspitas. Vinham fugindo da pobreza, da devastação causada por guerras, deixando para trás os pais, os amigos e a própria história.
Muita gente chegou aqui atraída pela propaganda oficial de terra de oportunidades. Mas era mentira. A maioria quebrou a cara e permaneceu na indigência, presa a condições análogas à escravidão. Teve quem conseguiu prosperar, na agricultura e no comércio, principalmente. Eram as exceções.
Para a geração Z, que nasceu após 1996, falar um idioma a mais parece natural. Os cursos estão mais acessíveis, até mesmo em aplicativos gratuitos com ensino e tradução simultânea. Todos querem conhecer novas culturas.
Mas uma grande parte sonha em fazer a vida fora. A isso se dá o nome de desesperança. Nos últimos anos, com a nação dividida em dois polos políticos contaminados por aproveitadores e eleitores fanáticos, nossos jovens não veem um horizonte promissor. André Malraux, já década de 1930, já não via luz quando afirmou que “o Brasil é apenas um país improvável.”
Possibilidades de dar certo existiram, mas foram jogadas na lata do lixo. A corrupção, que está presente nos três níveis de poder, suga os recursos públicos. Os mecanismos instituídos para conter essa sangria dificilmente alcançam o cerne do problema. Quando atingem, é de maneira pontual.
Já nos anos 1990, Paulo Francis deu uma explicação para o fosso que redunda no desânimo que nos assola: “O Brasil é um asilo de lunáticos onde os pacientes assumiram o controle.” Ainda não vimos subir ao poder uma geração que torne obsoleta a frase de Francis, ao reconduzir os lunáticos as suas camisas-de-força e os obrigue a devolver a chave do cofre.
Tente explicar para um vestibulando o que faz alguém torcer para o país ir para o buraco só porque o seu político de estimação não está no comando. O estudante tiraria 1.000 na redação do Enem se dissertasse sobre burrice. Ou peça para ele escrever sobre o que leva milhões de pessoas a viver sem oportunidades de estudo e emprego.
A conclusão a que chegaria certamente o conduziria ao mesmo pensamento do economista Roberto Campos, segundo o qual a saída para o Brasil são os aeroportos do Galeão e de Cumbica. Daí o sonho de trabalhar em outro país, principalmente da Europa ou os Estados Unidos.
Há alguns anos, o notável jornalista e escritor Roberto Pompeu de Toledo também deixou sua colaboração no rol de frases definitivas: “O Brasil é o país que acabou, mas continua.”

Foto: Rondoniadinamica

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