VENEZUELA E GUIANA – A GUERRA IMPROVÁVEL
*Por Luís José Bassoli
O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro retomou o assunto sobre a soberania da região de Essequibo, administrada pela Guiana, na fronteira com o país.
Histórico
Em 1777, a formação da Capitania-Geral da Venezuela, como colônia espanhola, incluiu o território.
A área era reivindicada pela Holanda, e acabou tomada pelos ingleses e oficializada como parte da Guiana Britânica em 1814.
Em 1899, a questão foi submetida ao Laudo Arbitral de Paris, tribunal criado anos antes, no Tratado de Arbitragem de Washington.
Os EUA representaram a Venezuela; o Reino Unido a colônia da Guiana Britânica.
A decisão foi favorável aos ingleses; a Venezuela protestou, alegando vícios de nulidade.
Em 1962, a Venezuela denunciou na ONU que a sentença do Tribunal de Paris era “nula e sem efeito”.
Em 1966, meses antes da independência da Guiana, a ONU determinou o Acordo de Genebra, que era transitório, “um acordo para chegar a um acordo”, que não invalidou a arbitragem de 1899, mas reconheceu a pretensão da Venezuela de anulá-la.
Reino Unido e a ainda colônia Guiana reconheceram que era preciso encontrar uma solução pacífica para a questão.
Independência da Guiana
O Acordo de Genebra estabeleceu uma Comissão Mista, com representantes de Venezuela e Guiana, que teria 4 anos para resolver o problema.
Sem solução
Foram 16 reuniões e nenhuma solução.
Em 1970, foi assinado o Protocolo de Porto Espanha, na capital de Trinidad e Tobago, entre Guiana, Reino Unido e Venezuela, que suspendeu o Acordo de Genebra por 12 anos; o Congresso venezuelano não ratificou o tratado.
Bons ofícios
Em 1987, ambos aceitaram o método de Bons Ofícios, no qual um Bom Oficiante é escolhido pelas partes para aproximar os dois governos.
No Bons Ofícios, diferentemente da Mediação, não há proposta para resolver a controvérsia, apenas a tentativa de aproximação.
Corte de Haia
Em 2018, a Guiana acionou a Corte Internacional de Justiça (Corte de Haia) para resolver a disputa; a Venezuela se negou a participar do processo e pediu a volta das negociações.
O porquê da recente tensão
A Venezuela voltou a reivindicar o território depois da descoberta de grande reserva de petróleo e gás na costa da região.
Um consórcio das petrolíferas norte-americanas ExxonMobil e Hess e da chinesa CNOOC iniciou a produção na Guiana há quatro anos, o que desagradou Caracas.
A Guiana reagiu: o presidente Irfaan Ali colocou a Força de Defesa em alerta máximo, acionou o Conselho de Segurança da ONU, deslocou equipes da capital Georgetown para a área – e cogitou criar bases militares estrangeiras no país.
Essequibo representa 70% do território guianês.
Plebiscito
No domingo (03/12), o governo de Caracas anunciou o resultado da consulta popular, na qual os eleitores aprovaram a criação de um novo estado venezuelano em Essequibo.
A Guiana havia apelado à Corte Internacional de Justiça para proibir o plebiscito; a Venezuela alegou não reconhecer a Corte e realizou a consulta.
Desafio para a diplomacia
Pela lei internacional, o plebiscito não dá poderes para a Venezuela usar a força contra a Guiana.
É certo, porém, que a solução, definitiva, ainda não foi oficializada pela ONU.
Na sexta-feira (8/12), o Conselho de Segurança da ONU se reuniu, mas não chegou a nenhuma solução.
O papel do Brasil
Há uns dias, o governo brasileiro foi anfitrião da reunião de chanceleres e ministros da Defesa da América do Sul, inclusive dos dois países, em Brasília, para discutir o tema.
O ministro das Relações Exteriores brasileiro, Mauro Vieira, declarou: “Defendemos que as controvérsias sejam sempre dirimidas por negociações ou por tribunais internacionais”.
Por cautela, o ministério da Defesa enviou 28 blindados do Exército para a fronteira com a Venezuela e ampliou o efetivo da Infantaria de Selva.
Diálogo em pauta
O presidente Nicolás Maduro deu sequência ao plebiscito e assinou, na sexta-feira (8/12), decretos para criar o estado de Essequibo.
No sábado (9/12), Maduro telefonou ao presidente Lula e, pela primeira vez, fez menção ao diálogo: “A Guiana e a Exxon terão que sentar e conversar conosco; queremos paz e compreensão”.
Horas mais tarde, o governo venezuelano comunicou que, depois de conversar com Lula, Maduro falou com o Secretário-Geral da ONU, Antônio Guterres, e com o presidente da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), Ralph Gonsalves, e concordou com a proposta de realizar uma reunião de alto nível com a Guiana, que será anunciada nos próximos dias.
Irfaan Ali, presidente da Guiana, disse que também conversou com Lula, que lhe garantiu que o Brasil “não aceitaria nenhum comportamento imprudente da Venezuela”, e agradeceu o envio de uma equipe diplomática brasileira para conversar com Maduro.
O Itamaraty anunciou que o presidente Lula visitará a Guiana em 2024, para a reunião da Comunidade do Caribe (CARICOM), bloco de cooperação econômica e política, formado por 15 países e 5 territórios da região.
(Com informações e imagens: G1, Poder360, CNN, Agência Brasil, UOL, CartaCapital, R7, Diario Las Américas, El Nacional e agências).
*Luís José Bassoli é advogado, jornalista, professor de Geopolítica do Colégio Objetivo e ex-professor de Comércio Exterior da FATEC, pós-graduado em Didática para o Ensino Superior pela Unip.
Colaborador do Tribuna, foi vice-presidente da Subseção da OAB e presidente da Câmara Municipal de Taquaritinga.