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Crônica da semana por Nilton Morselli

Procurando a turma

Outro dia, ao passar por um grupo de pessoas, ouvi uma expressão que me chamou a atenção não pela originalidade, mas por estar em desuso. O “vai procurar sua turma” era para um rapaz que devia estar importunando ou cuja presença era indesejada. O objetivo da interjeição é mandar o interlocutor ir dar um passeio para –quem sabe– encontrar seus iguais, que certamente o suportarão.

Com a possível exceção dos solitários vocacionais, o que mais as pessoas fazem na vida é procurar a sua turma. A sociologia de botequim diz que ter ou estar dentro de uma dá uma sensação de pertencimento, algo que faz para bem o indivíduo, encoraja-o para os desafios do cotidiano.

Quase sempre a adesão à primeira turma, digna desse nome, é na escola. Numa sala de aula de 30 alunos, geralmente existem várias turmas, conforme as tendências de cada um. Os estudantes se separam naturalmente, segundo variáveis como aptidão para esportes, extroversão, popularidade, e por fim, aquilo que leva os pais a matriculá-los: o interesse em aprender.

Há os excluídos e os que se excluem por não se identificar com nenhum grupo. Mais crescidinho, ouvi de meus pais que eu deveria ficar longe da turma dos maconheiros e dos bagunceiros, que normalmente formavam o famoso fundão, o terror dos professores.

Por aptidão ou teimosia, sempre preferi a turma do esporte. Uma folguinha e estávamos na quadra para bater uma bola de futsal, vôlei ou basquete. E confesso que algumas vezes cabulamos aula para ir, a pé, assistir aos jogos do CAT. O Taquarão era, e continua sendo, bem longe de onde eu estudava.

Fora da escola, às vezes temos uma turma paralela, constituída por vizinhos do quarteirão ou do bairro, incluindo um ou outro colega de sala. A lista de amigos vai crescendo, mas de repente diminui porque um ou outro vai procurar outra turma, conforme os interesses vão mudando.

Podemos trocar várias vezes de turma ao longo da vida, e nem é preciso procurá-las. De repente, você está enturmado. É um fenômeno até difícil de explicar. Mas, para ser considerada uma turma, precisa ter um número mínimo? Não necessariamente. Ela se caracteriza mais pela intensidade das atividades do que pela quantidade de membros.

E, claro, você pode fazer parte de várias turmas ao mesmo tempo, sem causar ciúme. Basta controlar bem a agenda. Tem aquelas, por exemplo, que só se reúnem ou se avolumam no Carnaval, porque a galera mora em cidades diferentes. Quando se encontra, a sensação é de que os amigos estão juntos toda semana. Muito louco isso.

Há um tipo especial, que não existe o tempo todo, mas se forma apenas naquele instante fatídico de arbitrar pequenas ou grandes dissensões. É a Turma do Deixa Disso (TDD), uma espécie de ONU informal, cuja autoridade já evitou inúmeras brigas ou até coisa pior. Creio que em algum lugar do planeta deva existir o estatuto da TDD, registrado em cartório, com as atribuições e os limites de seus membros eventuais. Já merecia um Nobel da Paz pelo conjunto da obra.

Ter ou manter uma turma dá uma ponta de orgulho. A longevidade delas depende do grau de afinidade. Elas se acabam, muitas vezes, como termina um amor: as pessoas vão se afastando e quando se dão conta nem se lembram quando foi o último beijo. A vida é assim, a eterna procura de uma turma para chamar de sua.

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