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Crônica da semana por Nilton Morselli

…E o clube não caiu

Assim como outras cidades, a minha sempre foi terreno fértil para gaiatices. Desde sempre sabíamos quem eram os reis dessa arte, mas não podemos de maneira alguma imputar-lhes a autoria das que entraram para a história ou, antes, para o nosso folclore. Agora mesmo estava lembrando de algumas que saíram do controle.
Hoje é fácil espalhar um boato, basta postar alguma falsidade nos aplicativos de mensagens instantâneas que em poucos minutos centenas, milhares de pessoas já estarão sabendo da novidade. Por mais cabeluda que ela seja, sempre haverá aqueles que acreditarão sem pensar duas vezes. A falta de contato físico aumenta a impessoalidade da parolagem digital. Mas antes do advento das mensagens de celular, as notícias falsas também grassavam feito rastilho de pólvora.
Uma delas dava conta de uma grande tragédia, que não passou de fake news, quando esse termo ainda não havia sido inventado, na maravilhosa década de 1990. Era um aviso, ouvisse quem tivesse juízo. Pouco antes do Carnaval, circulava de boca em boca a notícia de que alguma desgraça aconteceria durante a festa. Não demorou para alguém concluir: o Clube Imperial vai cair. Para quem nunca foi a um daqueles bailes de Momo, diga-se que o Imperial parecia um formigueiro, superlotado, nessas inesquecíveis noites de fevereiro. Outros afirmavam que a desdita viria em forma de bomba no meio do Trio Elétrico Batatão.
Certa vez o boato tomou uma proporção enorme, a ponto de interferir nas vendas dos ingressos do clube. A previsão inverossímil ganhou contornos de verdade quando apareceu na jogada o nome de ninguém menos que Mãe Dinah. A vidente famosa não saía dos programas de TV, geralmente antecipando catástrofes e flagelos para os quais o país precisava se preparar ou alguma desventura na vida de um artista. Apavoradas, as mães estavam proibindo os filhos de irem ao clube, simplesmente não lhes dando o dinheiro para comprar o passaporte da folia.
Bem, a sede social do Imperial é uma construção forte e imponente, mas antiga. Quando a saudosa Banda Blackout intercalava marchinhas com uma seleção de axés e toda aquela massa humana começava a pular, quem não pulava pulava sem querer, porque o piso tremia. Isso ninguém me contou, eu mesmo pude sentir sob meus pés. Por várias vezes, senti a laje indo e voltando embaixo deles. Sabendo que o prédio não tinha molas como fazem no Japão, aquilo só podia ser dilatação por fadiga do material. Era assustador, mas a gente não ligava. Até botarem a Mãe Dinah no meio.
Por nunca tê-la visto num baile do Imperial, juro que fiquei meio preocupado. Prever o nosso clube vindo abaixo sem nunca ter botado os pés naquele chão vibrátil era o cúmulo da sensitividade. Ela nunca errava. Mas o assunto haveria de ser passado a limpo. Foi a imprensa que interveio para pôr fim à confusão. O papel coube à Canal Um, que procurou a própria Mãe Dinah para dizer de viva voz que não fizera a previsão carnavalesca nem tampouco sabia de que lado do mapa ficava Taquaritinga.
Felizmente, passados tantos anos, o Imperial não caiu ou uma bomba explodiu no trio elétrico. A queda da sede social foi em sentido figurado, pois acabou indo a leilão para pagar dívidas trabalhistas. Para nossa sorte, as fake news estão com a vida cada vez mais curta e todas concentradas na política, onde fazem um baita estrago.

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