Crônica da semana por Nilton Morselli
Elevadores
Tinha 13 anos quando andei pela primeira vez de elevador. Foi no Solar dos Coqueirais da Rua Rui Barbosa, onde fui cobrar de um morador a assinatura do jornal em que trabalhava. Naquela época, havia porteiro presente –hoje você conversa com uma voz que fica sei lá onde.
O homem deu as instruções, informou o andar e o número do apartamento. Achei que fosse uma coisa intuitiva, mas acabou virando um périplo, que hoje lembro com bom humor. Mas na hora foi meio assustador.
Não sei por que, fui parar no último andar, onde –é lógico– não estava o apartamento. Silêncio absoluto. O ponto mais alto que alcançara. O ar, meio rarefeito, resultado do nervosismo. Voltei para a cabine e fui apertando outros botões, que me levaram ao subsolo. O aparelho subia e descia e nada de parar no andar certo.
Depois de uma meia hora, e deve ter sido sorte, consegui achar o destino. O morador, que já estava me esperando, estranhou a demora. Eu suava frio e o vaivém me deixara com tontura. Para a volta ao térreo, pedi que ele apertasse o botão correspondente.
Fiquei muitos anos preferindo usar a escada. Até que aprendi a lógica do elevador. Morava no terceiro andar.
*
O silêncio é ouro, mas no elevador ele é estanho, frio e desconfortável. Há quem prefira enfrentar uma escada de quinze andares a encarar os dez segundos de um percurso vertical ao lado de um vizinho desconhecido. O elevador é um palco improvisado onde todos atuam com um misto de polidez e fuga.
A cena se repete como um ritual: entra alguém, cumprimenta com um “bom dia” que mal escapa dos lábios. O outro responde com um aceno quase imperceptível, e os olhos procuram refúgio no painel de botões, no aviso de carga máxima, no teto, no chão, em qualquer lugar que não seja a face do companheiro de trajeto.
Há uma coreografia estabelecida: ninguém se encosta, todos se encolhem. O tempo se dilata como em filme de suspense. Um espirro quebra o clima e, por alguns segundos, instala-se o pânico coletivo. “Saúde”, diz alguém, tentando soar humano. Outro dá um sorriso amarelo. E outro fecha a cara e prende a respiração como se pudesse não absorver os vírus.
No elevador, o ser humano mostra sua habilidade milenar de evitar o contato enquanto finge sociabilidade. É uma cápsula de aço onde todos se transformam em versões educadas e incomodadas de si mesmos. Um simulacro de convivência em que a gentileza é um código e o incômodo, uma certeza.
E quando finalmente chega o térreo, os corpos se agitam para sair antes que o constrangimento vire diálogo. Ninguém quer conversar, ninguém quer se explicar, só seguir, aliviado, para o silêncio mais confortável do lado de fora.
Seria pedir muito que os elevadores fossem espaços de poesia ou filosofia de bolso. No máximo, um lugar para pequenas previsões de tempo, daquelas que fazemos para puxar assunto. São um breve espetáculo cotidiano da vida em sociedade –onde ninguém quer ser o protagonista, principalmente quando todos sentem um cheiro estranho no ar.
Imagem: Portal meuelevador.com


							



